21 de dezembro de 2010

Agnose

Existe uma diferença profunda entre Ateísmo e Ceticismo, mas me parece que a maioria das pessoas confunde um pouco os dois. Um ateu é, também, um crente: ele acredita em algo, mesmo que por contraste, mesmo que “negativamente”. Por exemplo: o ateu acredita que Deus não existe. Isto também é um artigo de fé. O cético nem acredita, nem deixa de acreditar: ele considera ambas as possibilidades válidas: pode ser que Deus exista… Pode ser que Deus não exista…

Um indivíduo pode ser não-religioso e, ao mesmo tempo, espiritual. Porque religião tem a ver com Deus – e, portanto, com fé - e espiritualidade tem a ver com si mesmo, com valores que embora as pessoas normalmente confundam, estão mais ligados a si próprio, ao seu íntimo, do que com divindades. Espiritualidade, da forma como a entendo, tem a ver com o dentro, enquanto que religião tem a ver com o fora. A espiritualidade necessariamente precisa brotar inicialmente do interior de um indivíduo, de seus questionamentos, curiosidades, reflexões, temores; é sempre um movimento de dentro para fora. A religião é, em primeiro lugar, um movimento exterior. Na maioria das vezes ela é imposta por pais ou pessoas do círculo íntimo de uma pessoa, em tenra idade, e é “adotada” ou “assimilada”, sem muitas reflexões, por toda a vida. É comum ouvir alguém dizer, por exemplo: “Sou católico porque meus avós e meus pais eram católicos, e sigo a religião dos meus pais…” Parece-me que um indivíduo religioso pode transformar-se também em espiritual enquanto que um indivíduo espiritual raramente se tornará religioso. Uma pessoa religiosa está ligada a dogmas, credos e preceitos que, via de regra, são mutuamente excludentes: apenas um credo, uma fé, um dogma são os ”corretos” enquanto a fé, os dogmas e os credos de outras religiões são encarados com um olhar condescendente ou francamente hostil. Na religião, uma só Verdade deve prevalecer. Uma pessoa espiritual vê pontos de sabedoria na maior parte das religiões, não uma única Verdade absoluta. O guru indiano Osho dizia que era como um pássaro em um jardim: por que deleitar-se apenas com o néctar de uma só flor, quando há tanto néctar em todas as flores do jardim? “Sou como um pássaro num jardim; vou de flor em flor (de religião em religião) bebendo daquilo que me interessa”. O desafio está em construir uma visão coerente, uma espiritualidade coerente, procedendo desta maneira – porque o risco é de acabar-se com uma miscelânea incoerente e bizarra nas mãos. Mas ninguém disse - eunão estou dizendo – que o caminho da espiritualidade é fácil…

Agnose não é Ateísmo – Agnose é aceitar que a assim chamada “Verdade” não é acessível pelos sentidos e pelo intelecto humano e que, portanto, a busca por Deus é inútil; não se trata de aceitar ou recusar Deus, mas sim de entender que um ser como Deus não nos é apreensível e/ou cognoscível e, portanto, a busca por Ele é destituída de real interesse prático. A Agnose não está preocupada em provar ou refutar a existência de Deus. A Agnose diz: tal interesse é inútil. Então o que resta? O Ateísmo? O Materialismo? O Niilismo? Não: a Espiritualidade que é voltada para o ser humano, que procura meios de aperfeiçoá-lo com a ajuda de uma série de ferramentas (Filosofia, Psicologia, Psicanálise, Esportes, Artes, Música, etc.), que não tem nada ou muito pouco a ver com a religião.

Levei muitos anos – e perdi precioso tempo – para entender que sou espiritual mas não religioso. Talvez por isso “religiões” como o Budismo me atraiam tanto: o Budismo, em sua essência, tem mais a ver com espiritualidade do que com religião. No Budismo não há Deus, mas há a busca por uma evolução interior – que, em tese, poderia também ser alcançada através das Artes, ou de praticamente qualquer outro instrumento -, a busca por um auto-aperfeiçoamento que, em última análise, serve para aquilo que é mais importante: a busca da felicidade.

Aqui: http://agnose.wordpress.com/